As medidas cautelares impostas pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes a Jair Bolsonaro após a operação da Polícia Federal na última sexta-feira (18) em sua casa, em Brasília, têm gerado controvérsias que, segundo especialistas, não deixam claro quais são os seus limites.
Na segunda-feira (21), Moraes complementou a decisão proibindo a veiculação de entrevistas de Bolsonaro nas redes sociais, sob pena de prisão do ex-presidente, e deu um prazo de 24h para que os seus advogados explicassem o suposto descumprimento das medidas.
No documento, o ministro proíbe “transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros”.
O “endurecimento” tem por objetivo impedir que Bolsonaro contorne a ordem anterior, que o proibia de usar redes sociais, diretamente ou por intermédio de outras pessoas.
A decisão ocorre no contexto de um inquérito que investiga a possível articulação de Bolsonaro e de seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), para pressionar autoridades estrangeiras — no caso, o governo dos Estados Unidos — a adotarem sanções contra autoridades brasileiras.
Moraes entendeu que há indícios de crimes como coação no curso do processo.
Defesa
A defesa do ex-presidente afirmou que a decisão, da forma como foi posta na segunda, vai muito além da proibição de utilização de redes sociais, e em nenhum momento ficou claro que foi proibido que Bolsonaro concedesse entrevistas, “o que aliás não condiz com a jurisprudência pátria”.
Completou garantindo que Bolsonaro não postou, não acessou suas redes sociais e nem pediu para que terceiros o fizessem por si.
Para especialistas ouvidos pelo R7, a ampliação da restrição abriu margem para uma série de dúvidas: afinal, quem está sujeito à proibição? A vedação se aplica a qualquer cidadão, a aliados políticos ou até mesmo à imprensa?
Amplas interpretações
Inclusive, o documento assinado pelos advogados Celso Vilardi, Paulo Bueno e Daniel Tesser diz que a “replicação de declarações por terceiros em redes sociais constitui desdobramento incontrolável das dinâmicas contemporâneas de comunicação digital” e não tem relação com a vontade de seu cliente.
Segundo o advogado penal e constitucional Ilmar Muniz a medida pode comprometer garantias constitucionais ao deixar espaço para interpretações amplas e subjetivas.
“Medidas com redação ambígua comprometem diretamente garantias como a liberdade de expressão, o devido processo legal e a liberdade de imprensa. A falta de clareza pode gerar interpretações excessivas, censura indireta e medo de responsabilização por parte de veículos de comunicação e cidadãos”, avalia.
Para o especialista, é importante que a decisão seja novamente questionada pela defesa.
“É essencial que o ministro possa, nesse caso, especificar a quem e como ficará essa decisão, incluindo quais temas expressos estão alcançados nela.”
Reações
A repercussão após o ministro ampliar a medida foi imediata. Além das dúvidas jurídicas, a decisão também provocou forte reação da oposição, que acusou Moraes de abuso de autoridade e censura.
A medida cautelar determinada por Moraes é uma alternativa à prisão preventiva. Previstas no Código de Processo Penal, essas medidas são aplicadas quando o juiz entende que há risco de prejuízo para a investigação ou possibilidade de novas infrações, mas sem que se imponha, de imediato, o encarceramento.
No entanto, o caráter genérico da ordem desta semana deixa em aberto em que termos ele pode ser responsabilizado.
Para Berlinque Cantelmo, especialista em direito penal e presidente da Comissão Nacional de Direito Penal Militar da Abracrim (Associação Brasileira dos advogados criminalistas), esse tipo de brecha é justamente o que coloca a decisão sob forte escrutínio técnico.
“Essa indefinição pode conter traços de contingenciamento politico que, além de ferir direito de defesa, sobrepõe os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade vez que pode atingir um objeto indeterminado, incluindo a liberdade de imprensa e a livre expressão de terceiros”, reflete.
Mas Cantelmo explica que não há como responsabilizar terceiros, pelo princípio da intranscendência penal, que garante que nenhuma privação pode ultrapassar a pessoa do acautelado, nesse caso, Jair Bolsonaro.
“Mesmo assim, é de se notar que a decisão do ministro Alexandre de Moraes implica em uma hipotética censura ao ex-presidente o que, de acordo com a principiologia constitucional, é vedado”, analisa o advogado.
A defesa de Bolsonaro pede que sejam explicados os termos exatos da proibição de utilização de mídias sociais, esclarecendo, inclusive, se a proibição envolve a concessão de entrevistas.
Além disso, diz que o ex-chefe do Executivo não pode ser punido por atos de terceiros.
“Compreender de modo diverso implicaria risco real de cerceamento indevido de liberdade, em razão de ações alheias à sua vontade”, ressalta.
Fonte: R7
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil